Ainda o art.30-A: captação ilícita de recursos

No post anterior, a Dra. Carla Karpstein fez importante comentário, que reproduzo, sobre o art.30-A, manifestando questionamento. Diz ela: "Professor Adriano: Ministrei aula nesse fim de semana em Pós-Graduação de Direito Eleitoral em Curitiba, justamente sobre a questão do 30-A, da inelegibilidade cominada através da desaprovação das contas e do enquadramento do julgamento das contas de campanha, pelo TSE, como matéria administrativa. Mas a minha dúvida se estabelece em relação ao melhor momento de utilização do 30-A: durante o curso da campanha eleitoral (através de AIJE) ou após a desaprovação das contas (utilizando-se como prova da investigação apenas a desaprovação,adaptando-se ao texto do 30-A)? Qual o momento mais efetivo? Seria uma opção do advogado, conforme a robustez das provas? Concordo que o prazo para ajuizamento seja aquele previsto para Ação de Impugnação de Mandato Eletivo - 15 dias após a diplomação - mas várias dúvidas surgiram na discussão com os alunos do Curso".

O art.30-A, no caput, fala em investigação judicial contra condutas em desacordo com a lei eleitoral relativas à arrecadação e gastos de campanha. Repete, na verdade, a antiga dificuldade perpetrada pela jurisprudência e doutrina no uso dos signos "representação" e "investigação judicial". Por isso, prescreve que os legitimados poderão "representar" à Justiça Eleitoral. Eis a integralidade do texto legal:
Dentro da reviravolta da jurisprudência eleitoral, com o fenômeno do ocaso da inelegibilidade, o TSE fez a distinção entre inelegibilidade e cassação de registro de candidatura e inaugurou uma nova ordem, segundo a qual as representações da Lei nº 9.504/97 (art.96, art.41-A etc.) eram distintas daquela prevista no art.22 da LC 64/90. Embora fossem a mesma, ao menos quanto ao art.41-A, eram distintas a partir do inciso XV, ou seja, separadas no que couber para permitir a execução imediata da decisão, fazendo ablação da incidência do art.15 da LC 64/90.
Abro aqui um rápido parêntese. A ação de direito material - ou seja, o meio de tutela do direito - é criação de direito material; a ação processual é o remédio posto pelas normas processuais para atuar o meio de tutela. (Esse tema mereceu debate na obra coletiva Polêmica sobre a ação: a tutela jurisdicional na perspectiva das relações entre direito e processo. Porto Alegre: Livraria dos Advogados, 2006, para onde remeto o leitor, nada obstante as divergências que pessoalmente tenha sobre os pontos de vista ali expostos, que estão sendo objeto de um artigo meu em preparo). Logo, a ação processual diz respeito ao rito; a de direito material, ao conteúdo. Quando se afirma que a representação do art.30-A segue o rito da AIJE, no que couber, está se afirmando que a ação de direito material criada por aquelas normas é diversa daquela da LC 64/90, seguindo porém o rito da ação de investigação judicial eleitoral com pré-exclusão dos efeitos do inciso XV do art.22 da LC 64/90, bem como do seu art.15. A expressão "no que couber" é posta pelo legislador para deixar saliente a construção pretoriana para o alcance do art.41-A e do art.73 da Lei 9.504. Fecho o parêntese.
Quando se pode propor a representação do art.30-A? Após o pedido do registro de candidatura, nada obstante possa alcançar fatos anteriores, como ocorreu no Caso Juvenil. Até quando se pode propor a ação? Até 15 dias após a diplomação, uma vez que pode ser objeto da ação os gastos realizados até a eleição e a arrecadação realizada até a data da prestação de contas.
Nada impede que sejam propostas mais de uma representação do art.30-A durante o processo eleitoral, bastando que haja (a) fato ilícito e (b) provas mínimas da sua ocorrência. Não cabe a ação para investigar suspeitas, com meras alegações sem suporte probatório. A petição inicial há de observar as normas do art.282 ss. do CPC.
Faço aqui um acréscimo. Quem são os legitimados para agir ativamente? Apenas partidos e coligações? O TSE, nas resoluções para a eleição de 2008, acrescentou o Ministério Público como parte legítima. Correta a decisão, porque o sistema jurídico põe o MP como fiscal da lei. Seria absurdo excluir-lhe essa faculdade processual. Doutra banda, pergunta-se: e os candidatos? Parece-me absurda qualquer decisão que faça uma leitura chapada do texto legal para excluir a legitimidade dos candidatos. Tal qual as demais ações eleitorais que têm a finalidade de aplicar a sanção de inelegibilidade (ainda que cominada simples), assim também haveremos de interpretar a representação do art.30-A.
Notem bem: o art.30-A revoluciona o processo de prestação de contas, porque deu-se aos atores eleitores um instrumento processual forte para atacar a captação ilícita de recursos ou gastos eleitorais ilícitos.

Comentários

Camila Campos disse…
Achei interessante especialmente um comentário feito acerca das legitimidade dos candidatos, questionada porque o texto legal nao o menciona. Muito fácil seria excluir todos os candidatos, mas seria justo?O mais importante: serve ao propósito desta lei?O mesmo interesse de partido e coligações em manter a lisura e a igualdade da campanha é compartilhado por qualquer candidato.

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