O Caso Alagoas e as urnas eletrônicas: litigância de má fé

Tenho estado excessivamente ocupado, o que tem me feito ausente do blog. Vamos retomar esse contato mais assiduamente, ainda mais em um ano eleitoral com tantas questões a serem analisadas.

Retomo o blog com a análise do julgamento do denominado "O Caso Alagoas" das urnas eletrônicas, que ocorreu na quinta-feira passada no Tribunal Superior Eleitoral (quem quiser informações sobre o tema, basta buscar aqui no blog os posts anteriores).

Nas sustentações orais dos advogados do candidato João Lyra, Fernando Neves à frente, insistiu-se na tese de que haveria a necessidade de submeter as urnas-e à perícia judicial, tendo em vista que: (a) haveria uma desconformidade entre o resultado oficial e as pesquisas eleitorais; (b) o parecer emitido pelo consultor Clóvis Fernandes demonstraria graves falhas no funcionamento das urnas-e em Alagoas; e (c) haveria o interesse público na realização da perícia, tendo em vista a necessidade de se espancar eventuais dúvidas sobre a lisura do pleito, o que faria com que a perícia fosse realizada às custas da Justiça Eleitoral e não suportada pelo candidato derrotado.

Em minha sustentação oral, refutei todas as premissas suscitadas: (a) as pesquisas do IBOPE demonstraram que o candidato Teotônio Vilela Filho havia ultrapassado na preferência do eleitorado o candidato João Lyra, tendo a pesquisa de boca de urna, divulgada pelo instituto Gape antes da divulgação dos resultados oficiais, confirmado a vitória de Teotônio Vilela justamente em percentuais próximos àqueles posteriormente divulgados pela Justiça Eleitoral; (b) o parecer emitido pelo consultor Clóvis Fernandes não trazia uma única afirmação apodítica, sendo um amontoado de opiniões inconclusas, como "em princípio, é possível que...", "deixa a sensação de mal funcionamento...", e coisas do gênero. Na verdade, a ação de impugnação de mandato eletivo deve ser proposta com base na suposta existência de fraude, causada por alguém dolosamente através de determinados procedimentos. A AIME proposta pelo candidato João Lyra pedia que houvesse uma perícia porque o autor teria dúvidas sobre a existência de fraude, sem apontar quem a teria praticado e em que ela consistiria, ou sobre a existência de um eventual mal funcionamento das urnas-e. Ora, a AIME não serve para satisfazer a curiosidade de derrotados ou para tirar dúvidas acadêmicas de técnicos ávidos para demonstrarem a correção das suas teses; e (c) o TSE havia determinado a realização de perícia administrativa pelo ITA ou pela Unicamp. Os advogados de João Lyra impediram a realização, afirmando que queriam a perícia judicial. Logo, passou o candidato a ter o ônus processual de adiantar os custos da perícia a ser feita pelo ITA, cujos honorários foram fixados em R$ 2 milhões de reais. Tendo o candidato declarado à Justiça Eleitoral possuir um patrimônio de R$ 235 milhões, evidentemente poderia suportar o custo da perícia, sendo ressarcido acaso fosse declarado o vencedor da ação.

Eduardo Alckmin, o advogado do PSDB, argumentou com proficiência sobre esses mesmos pontos.

O relator, Min. Fernando Gonçalves, proferiu um voto firme, minudente e duro, mostrando que a AIME proposta não se sustentava em pé, sendo uma ação temerária, inclusive pelo comportamento processual errático do candidato, que impediu a realização da perícia administrativa a ser feita pelo mesmo ITA, com custos suportados pelo próprio TSE.

Por essa razão, além de outras expostas detalhadamente em seu voto, não apenas declarou inepta a inicial, como declarou temerária a ação, decorrente de má fé processual, razão pela qual aplicou multa ao candidato derrotado.

A decisão foi unânime sobre a inépcia da exordial e a insustentabilidade da pretensão do candidato derrotado; por maioria, manteve-se a litigância de má fé (sobre o tema, aqui).

O TSE, com isso, encerrou pedagogicamente essas ações fátuas fundadas no argumento temerário de fraude nas urnas-e. A partir deste caso, ninguém mais terá coragem de usar esses pareceres para instruir ação alguma.

O Caso Alagoas, assim, é um divisor de águas: o fim dos ataques irresponsáveis ao sistema-e de votação brasileiro, que contribuiu de modo fundamental para a consolidação da nossa democracia. Como já houve quem dissesse, de fato, atacar as urnas eletrônicas "é choro de perdedor".

Comentários

Anônimo disse…
Infelizmente estamos vivendo em plena ditadura eleitoral. A população está totalmente desinformada. São eleitos quem os poderosos querem. As pesquisas de opinião fazem parte de um esquema montado: as urnas eletrônicas são totalmente manipuláveis. Ainda temos uma chance: é através do trabalho de concientização e informação aos eleitores que podemos mudar esta situação.
Site: www.fraudeurnaseletronicas.com.br
Unknown disse…
Cada qual com a sua religião. Falar em ditadura eleitoral no Brasil é cinismo. Postei o comentário com o link porque não vejo razão para censurar as idiossincrasias de cada um. Às vezes tenho vontade de acreditar em discos voadores, também.

Ditadura de quem? Do TSE? Um órgão de juízes transitórios? Um órgão presidido pelo liberal Marco Aurélio e, atualmente, pelo esquerdista Ayres Brito? Sei...
Anônimo disse…
Adriano não se preocupe ninguem vai precisar usar este relatório do professor Clóvis porque o TSE não para de criar e por isso já existe outro relatório, agora desmentindo as informações dadas pelo TSE aos deputados da CCJ da Câmara. Muito obrigada por ter trazido com tanta eficiência esse assunto a´publico, pois o julgamento ficou em evidência e através dele vocês informaram que as urnas estavam com funcionamento erratico não somente em AL mas em SP e RIO.

Maria Aparecida Cortiz
A questão possui relevo processual. De fato, a pretensão erigida em AIME foi equivocada e ponto.

O resto é discussão que se apresenta fora do contexto apresentado.

A dicussão contra urnas eletrônicas deve ser gizada em âmbito próprio, que não é por AIME.


Fabio Nogueira Rodrigues
Magno Machado disse…
'Como já houve quem dissesse, de fato, atacar as urnas eletrônicas "é choro de perdedor".'

Isso só pode ser piada, e de muito mal gosto. Se a urna eletronica fosse realmente tão confiável, o TSE aceitaria submete-la a testes verdadeiramente abertos de segurança.

Temos o sistema eletronico de votação mais antiquado *do mundo*, que o TSE teima em dizer que é infalível e recusa-se terminantemente a por essa infalibilidade à prova.

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