Diamantino, o art.30-A e o irmão do Ministro

A captação ilícita de recursos eleitorais foi introduzida pela Lei nº 11.300/2006, tendo como sanção a cassação do registro ou diploma do candidato. Dispõe o art.30-A introduzido na Lei nº 9.504/97:

"Art.30-A. Qualquer partido político ou coligação poderá representar à Justiça Eleitoral relatando fatos e indicando provas e pedir a abertura de investigação judicial para apurar condutas em desacordo com as normas desta Lei, relativas à arrecadação e gastos de recursos.
§ 1º Na apuração de que trata este artigo, aplicar-se-á o procedimento previsto no art. 22 da Lei Complementar n.º 64, de 18 de maio de 1990, no que couber.
§ 2º Comprovados captação ou gastos ilícitos de recursos, para fins eleitorais, será negado diploma
ao candidato, ou cassado, se já houver sido outorgado."
Diante da falta de critérios claros para a determinação do âmbito de incidência da norma do art.30-A, o Tribunal Superior Eleitoral fixou algumas premissas importantes, afastando a interpretação que ofertou ao art.41-A, ao menos do que diz respeito à proporcionalidade dos efeitos do ato lesivo. Assim, tal qual o art.41-A, cabe execução imediata da decisão que julgar procedente a representação do art.30-A (precedente: MS 3567/MG, rel. Min. Cezar Peluso, DJ - Diário de justiça, Data 12/2/2008, Página 8), porém, diversamente da captação de sufrágio, há a necessidade de se demonstrar a influência do ilícito no resultado do pleito.

Ou seja, não bastaria a comprovação pura e simples que teria havido descumprimento das normas sobre a captação de recursos eleitorais; seria fundamental, para a configuração do ilícito, que a irregularidade fosse de tal ordem que pudesse, ao menos em tese, influenciar o resultado do pleito.

Houve recente julgamento, que chamou a atenção da mídia, sobre a cassação de um prefeito da cidade de Diamantino, interior de Mato Grosso, cuja candidatura se opunha ao grupo político do irmão do Min. Gilmar Mendes, presidente do STF, que ocorreu em sede de ação de impugnação de mandato eletivo (veja a matéria aqui). O prefeito cassado, Erival Capistrano de Oliveira (PDT), apareceu em uma matéria da revista Carta Capital denunciando supostas irregularidades que teriam sido cometidas pelo seu antecessor, irmão do presidente do STF.

Segundo informação da mídia, a ação que levou a cassação teria sido uma Ação de Impugnação de Mandato Eletivo, que teria apurado que algumas doações feitas a Capistrano teriam sido provenientes de pessoas sem capacidade financeira para doar ou através de alguns recibos eleitorais com assinaturas falsas. O juiz eleitoral, então, determinou a cassação do diploma do candidato eleito e a diplomação e posse do segundo colocado, pertencente ao grupo político do ex-prefeito, irmão de Mendes.

Uma coisa é certa: se a ação proposta foi, de fato, a AIME, o caso apenas poderia ser analisado como abuso de poder econômico, cuja demonstração haveria de ser feita em conjunto com a sua repercussão no pleito. Não seria, pois, o caso de se aplicar o art.30-A da Lei nº 9.504/97. Afinal, as hipóteses que ensejam a propositura da AIME são aquelas do § 10 do art.14 da CF/88, não podendo ser, por meio dela, atacada a chamada captação ilícita de recursos eleitorais.

Bem, afora isso, não estou entre os que insinuam que a decisão judicial e a atuação do Ministério Público teriam sido para favorecer o grupo político do irmão de Gilmar Mendes (essa parece ser a posição precipitada de Luís Nassif, aqui). O fato do prefeito cassado ter dado uma entrevista contra Gilmar Mendes não o imuniza para a prática de ilícitos eleitorais; doutra banda, haverá sempre o Tribunal Regional Eleitoral e o próprio Tribunal Superior Eleitoral para se recorrer.

Como o presidente do STF assumiu posições belicosas contra a Polícia Federal e mesmo o Ministério Público, chamou para si a antipatia de algumas correntes de opinião e de algumas corporações, que tentam desestabilizá-lo e intimidá-lo. De toda a sorte, seria insano supor que alguém exercendo funções elevadas, exposto como está pelas diatribes de que vem participando, estaria se envolvendo pessoalmente, usando indevidamente o seu cargo, para interferir em questiúnculas paroquiais. Porém, o tempo dirá com quem está com a razão.

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