Urnas eletrônicas: TSE fará testes sobre a sua segurança

Faz algum tempo, estudiosos brasileiros vêm fazendo severas críticas às urnas eletrônicas (urnas-e), ao argumento de que a ausência de impressão material do voto impediria posteriores auditorias no processo eleitoral, gerando insegurança quanto à lisura do pleito. Não raro, esses estudiosos produziam pareceres em casos concretos, pondo dúvidas na contagem correta de determinada eleição, como ocorreu nas eleições de 2006 em Alagoas (a discussão ficou conhecida como "O Caso Alagoas", objeto de alguns posts neste blog).

Pessoalmente, sou favorável à impressão dos votos, embora as urnas-e já demonstraram o seu valor no Brasil, salvando a nossa democracia do mapismo e da manipulação de dados. É dizer, mesmo sem a impressão dos votos, entendo que qualquer esquema de manipulação de resultados demandaria um envolvimento de tantas pessoas e uma logística tão complexa, que se tornaria na prática impossível ou não-factícvel.

Seja como for, o Tribunal Superior Eleitoral determinou a realização de testes nas urnas eletrônicas, buscando demonstrar a segurança do sistema-e brasileiro:

06 de agosto de 2009 - 22h46

Na sessão administrativa desta quinta-feira (6), os ministros do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) decidiram confirmar a realização de testes de segurança no sistema eletrônico de votação. Em 30 de junho, a Corte havia aprovado essa medida, que era uma antiga reivindicação do Partido dos Trabalhadores (PT) e do Partido Democrático Trabalhista (PDT). Autores do pedido, os dois partidos desistiram da realização dos testes logo depois que o Tribunal concordou com a verificação da confiabilidade do sistema.

Os ministros aceitaram a desistência do PT e do PDT, mas o procurador-geral eleitoral, Roberto Gurgel, decidiu assumir a autoria da petição diante do interesse público em torno dos testes.

“Os testes transcendem o interesse desses dois partidos e passam a ser de interesse público”, disse o ministro Ricardo Lewandowski (foto), relator do processo.

De acordo com o presidente do TSE, ministro Carlos Ayres Britto, “esses testes têm tudo a ver com a lisura do processo eleitoral, a sua segurança e com a confiabilidade do voto”.

O teste de segurança para as eleições de 2010 deverá ocorrer em novembro próximo e vai colocar à prova o sistema eletrônico, por meio de tentativas a serem feitas para burlar seus programas. A Corte designou o ministro Ricardo Lewandowski para coordenar a realização do teste de segurança.

O processo tramita no TSE desde 2006. De acordo com o ministro, os testes só não foram realizados antes porque havia dificuldades técnicas que, agora, estão superadas.

Segurança do sistema

O processo eletrônico de votação já é acompanhado pelos partidos políticos e por representantes de instituições da sociedade, como a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e o Ministério Público. Em diversas etapas, o TSE já mantém instrumentos de controle abertos aos partidos, como o uso da assinatura digital, a lacração das urnas, o registro digital dos votos e a votação paralela.

Para a realização do teste, duas comissões deverão ser formadas. A Comissão Disciplinadora dos Testes de Segurança vai definir o escopo, a metodologia e a formatação dos testes, os critérios de julgamento, a análise e a aprovação das inscrições dos investigadores, o exame e a aprovação dos testes propostos pelos investigadores, a supervisão nos dias de execução e o registro das atividades executadas durante as aferições. Essa comissão será composta por servidores da Justiça Eleitoral, indicados pelo TSE.

Já a Comissão Avaliadora dos Testes de Segurança será responsável por validar o escopo, a metodologia e os critérios de julgamento definidos pela Comissão Disciplinadora, analisar os testes realizados e os resultados obtidos, julgar e examinar os artigos a serem publicados e por produzir o relatório final. A Comissão Avaliadora será integrada por professores universitários e cientistas, a serem indicados pelo presidente do TSE, por meio de portaria.

Além disso, a Comissão Avaliadora será composta opcionalmente, a depender da disponibilidade e do interesse de cada entidade, pelos seguintes participantes: por um representante, respectivamente, do Ministério Público da União, da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), da comunidade jurídica e por um representante do ministro do TSE coordenador do processo.

Aprovação da urna

A urna eletrônica usada nas eleições brasileiras é aprovada por 97% dos eleitores, de acordo com pesquisa de opinião pública realizada logo após as eleições de 2008 pelo Instituto Nexus para a Justiça Eleitoral.

Segundo a pesquisa, 90% dos entrevistados não relataram dificuldade para votar.

Votação paralela

A Justiça Eleitoral realiza, a cada eleição, a votação paralela, procedimento que visa a comprovar a confiabilidade do sistema eletrônico de votação e que se realiza no mesmo dia do pleito. Acompanham o trabalho uma empresa externa de auditoria contratada pelo TSE, além do Ministério Público, da Ordem dos Advogados do Brasil e de representantes dos partidos políticos e da imprensa.

Na véspera da eleição, o Tribunal Regional de cada estado faz o sorteio das seções eleitorais que vão ceder as urnas para a votação paralela. Em seguida, os equipamentos são retirados dos seus locais de origem e levados para a sede do Tribunal Regional, onde permanecem sob vigilância. A seção eleitoral sorteada recebe outra urna.

Atualização, 11 de agosto, às 10h11min

Em comentário neste post, Paulo Gustavo, membro da Transparência Brasil, assevera que o teste de segurança promovido pelo Tribunal Superior Eleitoral é de "faz-de-conta", ou seja, um procedimento para legitimar as urnas-e que, segundo os seus críticos, não teria a segurança necessária para garantir a higidez dos resultados do processo de votação. Essa seria a razão para a desistência dos pedidos de auditoria do PT e do PDT, evitando respaldar o procedimento anunciado pelo TSE.

Por que será que as sucessivas composições do TSE se colocam contrárias à auditoria livre, aberta e sem limites das urnas-e? Essa é uma pergunta importante, cuja resposta anda pendente nas diversas discussões e debates sobre o tema. Já houve quem acusasse o Min. Marco Aurélio Mello de "homem de direita"; agora, o TSE é presidido por "homem de esquerda", que fez militância política no PT. Independentemente do perfil político dos membros do TSE, ao longo da história sempre houve confiança no sistema-e eleitoral brasileiro, cujos resultados são excelentes.

Já debati aqui e noutros lugares o chamado "Caso Alagoas", que parte de premissas factualmente falsas, como a afirmação de que as pesquisas eleitorais apontavam a virtual vitória de João Lyra, candidato derrotado a governador. Ao contrário: as pesquisas mostraram o crescimento consistente da candidatura de Téo Vilela, sendo rigorosamente próximos os resultados das urnas-e e aqueles da pesquisa de boca de urna do Gape, instituto de pesquisa ligado ao grupo de comunicação de Fernando Collor de Mello, candidato ao senado e apoiador de João Lyra. É dizer, a justificativa utilizado se por dúvidas ao processo eleitoral era, desde o início, falsa e apenas serviram a interesses de determinados setores da academia.

Curiosamente, no Paraná, onde a derrota de Osmar Dias para Roberto Requião foi de apenas 1% dos votos válidos, ninguém entrou nesse debate, questionando o processo eleitoral e as urnas-e. Osmar Dias, aliás, tinha uma análise política do processo, sabendo identificar o porquê de ter perdido as eleições, ainda que por magra margem de votos.

De toda a sorte, comungo com a ideia de se ter o máximo de transparência sobre as urnas-e brasileiras, sobretudo no que diz respeito à prova material do voto, como ocorre, por exemplo, nas eleições russas. Seria um meio para se por fim à celeuma, bastando para isso a troca das nossas urnas por modelo símile ao russo, que funciona como um scanner do voto físico: vota-se no papel e a máquina ler o voto dado e depositado na urna-e, contabilizando de imediato o voto em meio eletrônico. Seria uma solução, porém não impugna o nosso modelo.

Atualização em 12 de agosto de 2009, às 8h47

Errei aqui quanto ao caro Paulo Gustavo, que confundi com um ilustre membro da Transparência Brasil. Conforme novo comentário, Paulo se identifica e chama a atenção para os resvalos políticos que muitas vezes esse tema das urnas-e suscita. Tem ele razão, nada obstante a questão aqui é complexa e multidimensional, naquele sentido empregado por Edgar Morin. Não há como se analisar a problemática das urnas-e apenas sob o ponto de vista da informática, devendo ser visto também os aspectos políticos salientes. Sempre observei nos debates sobre a matéria uma teoria presssuposta da conspiração, razão pela qual por diversas vezes busquei desbastar os argumentos usados para sufragá-la.

Mas aceito aqui as ponderações do Paulo Gustavo, como convido aos demais entendidos sobre o assunto a manifestarem a sua opinião. Abro aqui um campo livre ao debate, em um post apenas para comentários. Pelo volume de acesso diário neste blog, conforme dados do Google Analytics, é possível que tenhamos diversas pessoas que dominem o assunto e possam opinar livremente.

Comentários

Paulo Gustavo disse…
Adriano,

A "auditoria" em questão é apenas de faz-de-conta: o próprio auditado é quem vai estabelecer as regras, nomear os peritos e restringir quem pode ser assistente técnico.

Não sou eu quem estou dizendo: a própria notícia deixa claro que a comissão disciplinadora, que define as regras do jogo, é composta de técnicos do TSE. Na comissão avaliadora, o TSE tem 4 representantes, contra 1 da OAB e 1 do Ministério Público.

Partidos políticos? Ué, pra que convidá-los? Eles são chatos, fazem perguntas... E partido político não tem nada a ver com eleição, né?

Ah, pra participar da Comissão Avaliadora, tem que ter doutorado. Essa condição não é obrigatória para a Comissão Disciplinadora. Afinal, essa exigência foi criada só pra evitar que a OAB e o MP se atrevam a nomear determinadas pessoas que o TSE julga incômodas.

Foi por esses motivos que os partidos políticos que solicitaram a auditoria fizeram questão de deixar bem claro que não consideravam isso aí como sendo uma auditoria de verdade. Formularam pedido de desistência, para que depois o TSE não pudesse usar o nome deles pra homologar os resultados dessa história. Claro, já tá usando o nome deles pra dizer que desistiram, mas aí é outra história.
Paulo Gustavo disse…
Olá, Adriano, obrigado pelo update sobre meu comentário! :)

Gostaria apenas de esclarecer que sou apenas um bacharel em Direito, interessado por informática, manifestando minha opinião pessoal.

Não sou membro da Transparência Brasil. Essa entidade apenas uma vez manifestou-se quanto às urnas eletrônicas, porém inesperadamente em posição contrária à transparência por eles pregada.

Infelizmente, o assunto geralmente não recebe o tratamento técnico merecido, e as discussões acabam resvalando para questões políticas. Não se trata de confiar ou não no administrador eleitoral do momento, mas de seguir ou não métodos científicos universais de segurança da informação.

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