Prestação de contas: cuidado com o excesso de formalismo!

Tenho recebido diversas consultas simples por e-mail. Na Comunidade de Eleitoralistas, o fórum demonstra o interesse crescente sobre o tema: é a hora das prestações de contas.

Fico impressionado com a quantidade de perguntas sobre rejeição de contas decorrente de erros justificáveis, cuja existência não contamina o processo eleitoral. Por falta de uma orientação clara sobre o tema, ou mesmo por falta de discernimento quanto ao papel democrático do voto, magistrados e membros do Ministério Público, todos bem-intencionados, têm rejeitado a prestação de contas apresentada por candidatos, muito deles (candidatos) sem a assistência técnica necessária, por não terem recursos suficientes para pagar adequadamente um bom profissinoal. Esse rigor formalista tem gerado um resultado assombroso na prática, com inúmeras contas rejeitadas pelos mais tolos motivos.

Um candidato esqueceu de declarar o uso gratuito de serviço jurídico de um sobrinho, iniciante na profissão; outro usou um carro adquirido no ano da eleição em sua campanha; outro fez despesas de pequeno valor antes da abertura da conta bancária e da obtenção do recibo eleitoral, etc. Fatos de nenhuma relevância para o processo eleitoral que, quando muito, ensejariam a aprovação das contas com ressalvas. Porém, presos à letra da resolução do TSE, não faltam assessores técnicos detonando prestações de contas, sendo seguido por juízes eleitorais dispostos a aplicar as normas editadas pelo TSE sem qualquer sopesamento ou ponderação.

As prestações de contas, desse modo, estão se transformando em um calvário para candidatos sem estrutura, em municípios pobres ou não, que passam a se submeter a um rigor formal para o qual não estão preparados. Trata-se de uma nova forma de excluir da disputa os menos aquinhoados.

É preciso cautela na apreciação das contas. Entender que o fim do processo eleitoral é a escolha legítima dos representantes do povo, dentro da observância de regras que contribuam para a igualdade da disputa e possibilitem que os menos favorecidos possam ter acesso aos mandatos eletivos. A prestação de contas é um meio de evitar o abuso de poder econômico, a desigualdade da disputa em favor dos mais favorecidos. Não pode se transformar, agora, em um instrumento que gere efeito justamente contrário, punindo quem não condições de ter adequado assessoramento técnico.

Comentários

Wagner Cordeiro disse…
Boa noite Dr. Adriano.
Em uma AIME onde os fatos já foram todos decididos em sede de Representação Eleitoral, é possível arguir coisa julgada? Todos sabemos que o abuso de poder econômico deve ter potencial suficiente para desequilibrar o pleito e que a prova do abuso deve ser inconcussa. A mera prova testemunhal pode ensejar uma condenação, principalmente, quando prestados por vereadores eleitos, correligionários, familiares do candidato derrotado?
Unknown disse…
Boa noite, professor Adriano.
Caberia ao cartório eleitoral, então, numa atividade administrativa, corrigir o formalismo e o rigorismo existentes na resolução 22.715 do TSE? Isso não seria desobediência deliberada à diretriz estabelecida pela instância máxima da Justiça Eleitoral.
O que ocorre na prática, é que candidatos anunciam aos quatro ventos que estão endividados em razão da campanha, que gastaram muito dinheiro, mas na prestação de contas essa movimentação financeira não aparece e o procedimento de fiscalização se torna uma grande encenação. Quanto surge uma ponta de
"iceberg" nessas prestações falsas, por ser ponta acaba se enquadrando no princípio da insignificância e a história de caixa dois tende a se repetir...

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