O fim da república dos derrotados?

Ao que parece, uma das extravagâncias do entulho autoritário estará chegando ao fim: a república dos derrotados. O Senado Federal estaria modificando a regra do jogo, impedindo que o segundo colocado nas eleições assumisse o mandato eletivo com a cassação do diploma do vencedor (aqui). Sempre fui crítico dessa lógica antidemocática, perversa, que desconsidera a vontade do eleitor expressa nas urnas. Qual a legitimidade do segundo colocado para assumir o mandato que não lhe fora conferido pela maioria dos eleitores?

Os exemplos recentes do Maranhã e da Paraíba revelam uma crescente distorção no nosso sistema eleitoral, com uma perigosa deslegitimação democrática: o eleitor vai às urnas sabendo que a sua vontade não será absoluta na definição dos eleitos, mas crescentemente relativizada em proveito de uma lógica achavascada: vence quem perde, leva a melhor quem não teve votos suficientes para se eleger. Dir-se-á: mas não se teve os votos em razão de compra de votos ou de abuso de poder do vencedor, tanto que o seu mandato fora cassado. Redarguo: pois bem, que se fala nova eleição, para que novamente o eleitor, no exercício da soberania popular, decida quem será o seu representante, desta sorte sem que da eleição participe quem deu causa à nulidade dos votos, fraudando a eleição.

Ainda preciso me deter sobre os aspectos jurídicos dessa proposta de mudança, porque o Código Eleitoral, com o seu art.224, tem natureza de lei complementar, ao passo que o Senado está alterando - se não me engano - apenas a Lei nº 9.504/97. Depois de ver o texto, tratarei do tema aqui.

Comentários

Anônimo disse…
Concordo com o Dr. Adriano Soares, quando assevera a “lógica antidemocrática” na assunção automática do segundo colocado ao cargo eletivo do qual fora cassado o candidato impugnado.
Na realidade, impõe-se aferir a existência de legitimidade popular do candidato que obteve a segunda colocação, o que se se depreende pelos votos angariados por ele no pleito majoritário.
É que, mesmo afastando-se o candidato cujo mandato fora ilicitamente obtido, poder-se-ia cogitar, à luz do princípio democrático, a ausência de legitimidade do segundo colocado na hipótese de ter granjeado irrisória votação no pleito, o que constituiria inegável óbice à sua diplomação, justo por faltar-lhe representatividade, tendo em vista não expressar a vontade popular soberana, não se olvidando que o povo é o verdadeiro titular do poder, exercido temporariamente por meio de seus representantes (CF, art. 1°, parágrafo único).
Daí porque, fazendo coro ao nobre professor Adriano Soares, o objetivo da realização de novas eleições é, exatamente, a de assegurar a legitimidade da investidura dos titulares de mandatos, evitando que um candidato sufragado pela minoria venha a assumir o poder, em evidente afronta aos postulados maiores da soberania popular e do regime democrático.
O que sempre me causou perplexidade, contudo, era o entendimento reiterado do TSE de determinar que, em sede de AIME julgada procedente, fosse o segundo colocado nas eleições convocado a assumir a chefia do Executivo, não se aplicando o art.224 do CE (cf. acórdãos n° 1.851/2006, 21.261/2004 e 3.030/2003); por outro lado, quando tal cassação se dava no bojo de representação eleitoral (por exemplo, por prática de captação ilícita de sufrágio a que alude o art. 41-A, da Lei 9.504/97), considerava cabível a realização de novo certame eleitoral, por aplicação do art. 224 do Código Eleitoral (cf. acórdão n° 3.444/2006).
Ora, se no final das contas, o resultado das ações era o mesmo: afastar do cargo o candidato que se utilizou de condutas fraudulentas com o escopo de cooptar indevidamente o voto do eleitor, nunca me resignei a essa distinção de efeitos conferida pelo TSE, notadamente porque o art. 224 não estabelece qualquer restrição à sua incidência com base na natureza da ação, seja ela investigativa ou impugnatória, de forma que, consoante regra básica de hermenêutica, “onde a lei não distingue, não cabe ao intérprete distinguir”.
Agora, pelo teor da reforma anunciada, parece que esta discussão perderá o sentido...
Abraço a todos
Eduardo de Carvalho Vaz Porto
Anônimo disse…
Ouso discordar veementemente de tão ilustre autoridade em Direito Eleitoral, Dr. Adriano Soares, argumentando que a realidade focada por referido eleitoralista é diversa da verificada nas inúmeras pequenas cidades existentes Brasil a fora, cujo os destinos de tais munícipes são conduzidos à base do quem tem mais pode sempre mais... Por mais que se diga que os órgãos de controles estão se aperfeiçoando, certo é que ainda prevalece o poderio econômico; a intimidação, a coação; os quais se traduzem na imposição do Prefeito, nestes casos, de ferrar(marcar) o seu território eleitoral com vantagens econômicas, promovendo o antidemocrático desequlíbrio, ao arrepio das autoridades, eis que ninguém é capaz denunciar a famigerada compra de votos porque o desaparelhamento estatal harmoniza-se com a omissão de seus agentes, consequentemente, não garantem a integridade física do denunciante. Por isso, que dirá do Prefeito corrupto que, mesmo cassado, ainda deflagra o abuso de poder econõmico para eleger o seu sobrinho; o seu tio,com objetivando de se manter no poder em detrimento dos adversários(que não têm forças econômicas para lutar)contra tais mazelas. Não são poucas as engenhosas tentativas do opressor manter-se no poder, utilizam-se de quaisque manobras ilegais, até mesmo tentando se eleger em cidades vizinhas. E o povo, este continuam a mercê das benesses do corruptor, enquanto o oponente silencia ante as forças do inflator. Por isso, depõe mais ainda contra a democracia a estúpida possibilidade do Prefeito cassado - que apoderou-se de significativas quantias do erário - eleger interposto parente na eleição suplementar do que o segundo colocado assumir o poder, pois este já fora vitimado pela ilegítima vitória do cassado, que continua sobrepujado na ilegalidade de sua conduta impunível.

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