Sindicatos e eleições: o módico preço da democracia

A Ministra Nancy Andrighi, do Tribunal Superior Eleitoral, condenou o Sindicato dos Professores de São Paulo com multa por propaganda eleitoral antecipada de conteúdo negativo contra o pré-candidato à Presidência da República José Serra, consoante noticiado pelo site oficial do TSE (aqui):

A ministra Nancy Andrighi afirma, em sua decisão, que o direito dos sindicatos de se manifestarem sobre aspectos da política nacional (artigo 9º da Constituição) não pode ser extrapolado, a ponto de se confundir a liberdade de expressão e a livre manifestação do pensamento, garantidas pela Constituição, “com a interferência negativa na imagem de homem público”.

“O conteúdo das declarações não deixa dúvida de que não se tratou de temas de interesse da categoria - professores da rede pública -, ou mesmo de questões nacionais de interesse político-comunitário”, ressalta a ministra.

Segundo a relatora, de fato as expressões utilizadas na manifestação foram intencionalmente direcionadas a prejudicar uma candidatura do então governador de São Paulo, José Serra, à Presidência da República.

A ministra afirma que “a toda evidência” o que ocorreu no evento do sindicato dos professores de São Paulo foi uma “manifestação de cunho eleitoral e depreciativo”, que se traduz como propaganda eleitoral negativa e antecipada. Ela destacou que os requisitos da propaganda eleitoral também ocorrem na via inversa, ou seja, quando se divulga afirmações que levem o eleitor a não votar em determinado candidato.

Os sindicatos, sustentados hoje sobretudo com recursos públicos, estão proibidos de ter atuação política de natureza eleitoral. Não podem doar recursos para as campanhas eleitorais, nem mesmo indiretamente, por meio de propagandas com finalidade de sabor nitidamente político.

Em Alagoas, por exemplo, a CUT e sindicatos a ela filiados, todos estreitamente vinculados ao Partido dos Trabalhadores, têm veiculado uma campanha publicitária, em horário nobre da Rede Globo, com mensagens ofensivas ao Governador e pré-candidato à reeleição, Teotônio Vilela Filho, com a clara finalidade de atingi-lo eleitoralmente, tomando para si a tarefa de cumprir uma missão nitidamente eleitoral: desgastá-lo perante a opinião pública tratando de temas alheios ao interesse dos servidores públicos.

A CUT/AL, punida pela Justiça Eleitoral por duas vezes, com multas aplicadas a ela e ao seu presidente, passou a se utilizar dos sindicatos filiados para simplesmente descumprir as decisões judiciais e continuar com a campanha eleitoral antecipada. Antes, onde aparecia o nome da CUT, agora aparece o nome de um Sindicato, como na mídia abaixo, em que foi a Central substituída pelo SINDPOL, o sindicato dos policiais civis.

O uso debochado dos sindicatos para fazer campanha eleitoral antecipada de conteúdo negativo é uma afronta à democracia. Abusando da legitimidade de entidades que deveriam lutar pelos interesses dos servidores, os partidos políticos usam a sua influência e poder de direção nos sindicatos para transformá-los em instrumento de ataque aos adversários, bancando com dinheiro público do imposto sindical eventos e campanhas midiáticas de finalidade tipicamente eleitoral. E ainda - como em Alagoas - peitam a Justiça Eleitoral, montando uma cínica estratégia de dividir entre eles as multas aplicadas, um se substituindo ao outro impedido de veicular as propagandas ilícitas, mas todos cumprindo uma tarefa adrede preparada: atingir politicamente o adversário político dos partidos políticos que dominam as instâncias sindicais.

É por isso que a Justiça Eleitoral necessita aplicar a tutela inibitória em casos que tais, marcados com a repetitiva e desbragada afronta às suas decisões e à legislação eleitoral, porque na maioria das vezes o fim perlustrado pela propaganda antecipada é alcançado, mesmo que à custa do pagamento de multas, que gostosamente os interessados pagarão. Ou seja, a relação custo-benefício já teria sido adequadamente equacionada pelos promotores de tais propagandas, de modo que valeria a pena o descumprimento das decisões judiciais: o preço a pagar já estaria computado na estratégia utilizada.

Fica claro, desse modo, que os remédios processuais utilizados para coibir esse tipo de abuso não podem ser aplicado apenas posteriormente à violação da norma jurídica. Diante de um comportamento reiterado do infrator, a única forma de salvaguarda o respeito ao ordenamento jurídico é a aplicação da tutela preventiva, de caráter inibitório, em que - para além de censura prévia - a Justiça Eleitoral proíbe por um determinado período a veiculação de publicidade daquelas entidades que estão descumprindo sistematicamente a legislação, inclusive sob pena das emissoras de televisão e rádios ficarem com a sua programação suspensa por 24 horas, conforme o art.56 da Lei nº 9.504/97.

Sem o uso de instrumentos jurídicos firmes, a Justiça Eleitoral corre o risco de ficar sendo constantemente desmoralizada por peças publicitárias como a que reproduzo abaixo, veiculada mesmo depois de decisões judiciais que as proibiam:

Comentários

Mateus C Q disse…
Prezado Adriano, há um tempo - desde os episódios de propaganda antecipada pelo PT Nacional, Dilma e Lula - venho pensando no pleito de tutela de caráter inibitório na seara eleitoral, especialmente nos casos de propaganda. Isso porque o maior ganho para o processo eleitoral está em evitar a prática ilícita a simplesmente aplicar multas irrisórias e que compensam, pelo ganho com a divulgação.

Acha que o desenvolvimento dogmático da questão é viável?
Unknown disse…
Sim. Na representação que subscrevi contra o SINDPOL fundamento teoricamente o cabimento da inibitória em casos que tais. O que não pode haver é o sistemático descumprimento das normas eleitorais, apenas com uma posterior tutela sancionatória, sem que nada se previna.

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