Inelegibilidade cominada a ato ilícito não é sanção, diz o TSE. Deve ser um presente, então!

Sempre chamei a atenção para a necessidade de salvar o direito eleitoral do praxismo, esse vício da infância dos ramos jurídicos. Os institutos jurídicos merecem ser levados a sério, sobretudo em uma democracia.

Sempre chamei a atenção para os riscos dessa ausência de tratamento sério, científico, dos institutos eleitorais. Conceitos como elegibilidade e inelegibilidade não eram institutos vazios, indeterminados. Muito embora fossem maltratados pela doutrina, alheia ao cuidadoso tratamento dogmático que mereciam, foram eles, elegibilidade e inelegibilidade, sempre tratados pela jurisprudência de um modo errático, à falta de critérios teóricos dignos para a sua aplicação prática.

O Tribunal Superior Eleitoral, pelo voto condutor do Min. Arnaldo Versiani, nos autos da Consulta 1147-09, pronunciou-se sobre relevantes temas suscitados pela Lei Complementar 135. O eixo condutor da fundamentação judicial está em uma proposição teórica importante: a inelegibilidade não é pena, não é uma sanção. É certo que o voto não justifica racionalmente a afirmação; limita-se a reproduzir decisões do passado, que também não justificam racionalmente o enunciado.

Estava eu em Pernambuco, ministrando um curso de direito eleitoral para servidores do TRE daquele Estado. Essa a razão pela qual silenciei por aqui. E também para poder ler, reler, refletir, meditar e pensar sobre a decisão, sobre os fundamentos apresentados pelo caro Min. Arnaldo Versiani.

Falarei adiante sobre cada proposição relevante do voto, mostrando - com todas as vênias - a sua absoluta e lamentável falta de consistência teórica. Sobretudo por partir de uma falsa proposição dogmática: a de que a inelegibilidade - nenhuma delas - seria uma sanção, uma pena. Nem mesmo - vejam só! - aquela aplicada acessoriamente à sentença penal condenatória ou aquela aplicada ao fato ilícito eleitoral do abuso de poder econômico.

Há os que têm uma visão panglossiana da Lei Complementar 135. Agora, tenho razões de sobra para nutrir o mesmo sentimento. Sim, alvissaras!, a inelegibilidade não é uma sanção. Quem sabe, penso eu cá com os meus botões, seja um presente que o nacional recebe... Viva a nova teoria da contrariedade a Direito. Não gera sanção o fato ilícito.

Por ora, deixo aqui publicado o voto proferido, para que possa ser lido em sua inteireza. Amanhã escrevo sobre ele, fazendo uma análise sobre os seus fundamentos. Boa leitura.

Comentários

Rodrigo disse…
Estarei aguardando suas reflexões ansiosamente.

Pelo prenúncio, suponho que concordarei com todas, infelizmente.
Mestre Adriano:

Esse raciocínio jurídico da não-pena, no caso de inelegibilidade ligada a fato ilícito, me daria pena, não fosse uma pena para o Direito que o que é pena, pena não seja considerado.

Pena de nós, povo brasileiro...

Pena de que o tipo de cidadão-eleitor e o tipo de cidadão-candidato que o ficha limpa pressupõe sejam tão díspares:

presumen o povo incauto, infantil, destituído de raciocínio crítico e seletividade para o seu eleitor;

e o candidato, é presumido indigno, de vida indigina, presumido culpado, até sentença que o digna inocente, mas sentença impotente para lhe conferir elegibilidade, mesmo diante de sua preferência popular e partidária.

Eleitor criança e candidatos bandidos!

Que bom que temos uma justiça eleitoral mãe protetora e paternalista, que nos dirá em quem votar e como votar, salvando nossa democracia de nós mesmo, o corpo de eleitores de alma vazia...

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